O que muda na estruturação e na tributação do patrimônio familiar
A holding patrimonial sempre foi uma ferramenta importante para quem deseja organizar o patrimônio da família, facilitar a sucessão hereditária e, de quebra, aproveitar benefícios tributários legais. No entanto, com a recente Reforma Tributária, muita coisa muda e vale a pena entender os impactos práticos.
Neste artigo, vamos comparar como funcionava a holding antes e o que muda após a reforma, especialmente nos aspectos fiscais e sucessórios. A ideia é trazer uma visão clara e objetiva, mesmo para quem não é da área contábil ou jurídica.
O que é uma Holding Patrimonial?
De forma simples, uma holding patrimonial é uma empresa criada com o objetivo de concentrar bens (principalmente imóveis) de uma ou mais pessoas da família. Ela é muito usada para:
- Organizar o patrimônio de forma mais eficiente;
- Evitar conflitos familiares em caso de falecimento de um dos sócios;
- Facilitar a gestão dos bens e contratos (como aluguéis);
- Reduzir a carga tributária, de forma legal e planejada.
Como era antes da Reforma Tributária?
Antes da reforma, as holdings patrimoniais podiam optar pelo regime do Lucro Presumido, que aplicava alíquotas reduzidas sobre a receita de aluguéis. Além disso, os lucros distribuídos aos sócios eram isentos de imposto de renda (art. 10 da Lei nº 9.249/1995), o que aumentava bastante a eficiência fiscal.
A estrutura permitia também um planejamento sucessório eficiente, com a doação das cotas da empresa para os herdeiros, muitas vezes com reserva de usufruto e outras cláusulas de proteção, conforme autoriza o art. 1.789 do Código Civil.
ITCMD e ITBI na Integralização de Imóveis
Um ponto sensível sempre foi a tributação sobre a entrada de imóveis no capital social da holding:
- O ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) incide quando há doação de bens para a holding. A alíquota varia conforme o estado e deve ser considerada no cálculo total.
No caso de falecimento de um dos sócios, os herdeiros recebem as cotas da holding por meio do processo de inventário. Nessa situação, incide o ITCMD sobre o valor das cotas sociais transmitidas. A grande vantagem é que, com a estrutura da holding, o imposto é calculado com base no valor das cotas (geralmente menor e mais fácil de controlar) e não sobre o valor de mercado de cada imóvel individualmente. Isso pode representar uma redução significativa da carga tributária no momento da sucessão.
Além disso, como as cotas são indivisíveis, evita-se a fragmentação patrimonial e facilita-se o cumprimento de cláusulas de indivisibilidade ou impenhorabilidade, preservando a gestão profissional do patrimônio familiar.
- O ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis) é normalmente cobrado quando se transfere um imóvel para a empresa. No entanto, a Constituição Federal (art. 156, §2º, I) prevê que não há incidência de ITBI na integralização de capital social, salvo se a empresa tiver como atividade principal a compra e venda ou locação de imóveis.
Apesar de muitos municípios cobrarem o ITBI, o STF já decidiu em Repercussão Geral (RE 796.376/MG, Tema 796) que essa imunidade se aplica mesmo que a empresa tenha atividade imobiliária, desde que a operação seja para compor o capital social. Ou seja: é possível integralizar imóveis na holding sem pagar ITBI, desde que haja boa documentação e que a operação seja genuína.
O que muda com a Reforma Tributária?
A Emenda Constitucional 132/2023 e propostas legislativas em andamento (como o PL 2.337/2021) trouxeram importantes mudanças:
- Tributação de lucros e dividendos: O que antes era isento, agora pode ser tributado em até 15%, conforme proposta do art. 3º do PL 2.337/2021.
- Possível exclusão do Lucro Presumido para atividades passivas: As receitas com aluguéis, se forem a atividade principal da holding, podem perder o direito de usar o lucro presumido, conforme previsão do art. 14 da Lei nº 9.718/1998 e possíveis atualizações com a reforma.
- CBS e IBS: A nova forma de tributar o consumo pode afetar indiretamente holdings que operem com prestação de serviços, conforme a EC 132/2023 e futuras leis complementares.
Comparativo prático: antes e depois
Aspecto | Antes da Reforma | Após a Reforma |
Tribut. de aluguéis | Lucro presumido (11,33% efetivo) | Pode migrar para regime mais oneroso |
Distribuição de lucros | Isenta (Lei 9.249/1995) | Sujeita a IR de até 15% (PL 2.337/2021) |
Planejamento sucessório | Doação de cotas com usufruto | Permanece, mas com menos atratividade |
ITBI na integralização | Disputado pelos municípios | STF reforça não incidência (RE 796.376) |
Custo e complexidade | Moderado | Alta complexidade e necessidade de revisão |
E agora, vale a pena fazer uma holding?
A resposta é: depende. A holding patrimonial ainda é uma ferramenta valiosa, especialmente para organização e proteção dos bens da família. No entanto, com as novas regras, o planejamento precisa ser mais cuidadoso e personalizado.
Mais do que nunca, é essencial contar com uma equipe técnica qualificada para avaliar cada caso, considerando:
- O perfil dos bens e da família;
- As vantagens sucessórias ainda presentes;
- O impacto da tributação futura sobre os rendimentos;
- A forma de integralização do capital (evitando ITBI indevido);
- A necessidade de revisão dos contratos e do objeto social da empresa.
Conclusão
A Reforma Tributária não acaba com as holdings patrimoniais, mas muda as regras do jogo. Para continuar colhendo os benefícios dessa estrutura, é preciso ajustar a estratégia com base no novo cenário. A boa notícia é que, com planejamento e orientação qualificada, é possível manter segurança, organização e eficiência na gestão do patrimônio familiar.